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  RISCOS E OPORTUNIDADES COM O LULA E O PT  
 

Terça-feira, 1 de outubro de 2002.

RISCOS E OPORTUNIDADES COM LULA E O PT

Com a bastante provável vitória de Lula na eleição presidencial que se aproxima, alguns fatos passam a ter importância crucial para analisar-se o futuro da economia brasileira e do país como um todo. O primeiro deles é como projetar as probabilidades de êxito de uma eventual administração petista para os próximos quatro anos e o segundo é procurar respostas sobre como o mercado e a sociedade em geral vão reagir a essa vitória e, consequentemente, que tipo de pano de fundo Lula vai enfrentar uma vez empossado no cargo.

Para analisar as possibilidades de êxito, investiguemos os principais óbices que normalmente se levantam contra Lula e o PT:

1 – Lula é despreparado.

2 – Não dá para acreditar em quem há apenas quatro meses defendia a implantação do socialismo e a ruptura com os mercados.

3 – Lula e o PT são comprometidos com o corporativismo e não vão fazer as reformas.

4 – A situação financeira é complexa e os economistas do PT têm idéias que nunca deram certo em lugar nenhum onde foram tentadas.

5 – Dizem que os radicais foram todos controlados, mas eles estão todos lá, nenhum saiu do PT e, uma vez no poder, quem garante que continuarão sob controle.

6 – O PT é corrupto, os jornais noticiam diariamente os favorecimentos nas prefeituras e governos petistas à empresas ligadas ao partido.

7 – Lula vai fazer o país passar vexame quando tiver que representá-lo internacionalmente.

8 – O PT prega a volta de um Estado forte, quando os países que dão certo são os que abandonaram esse conceito.

9 – O MST, a CUT, a Pastoral da Terra e outras entidades radicais vão virar governo junto com o PT.

10 – Os Estados Unidos vão virar as costa para o Brasil numa hora imprópria.

1 – O Despreparo. Trata-se de preconceito apesar de haver um fundo de verdade. Um presidente não precisa ter graduação universitária para ser competente. As virtudes necessárias ao cargo são outras como capacidade de liderança, capacidade de conciliar, espírito negociador e força moral, e estas todas Lula as possui. Reagan entrou para a história como um dos maiores presidentes americanos e suas credenciais eram as de ator de segundo nível em Hollywood. Outras virtudes como visão de futuro, discernimento estratégico e “aggiornamento” Reagan as possuía e Lula não e, de fato, uma vivência universitária poderia ter-lhe proporcionado adquiri-las , pois o candidato é muito inteligente e aprende rápido e, assim, este ponto é o único que confere um pouco de fundamento à tese do despreparo. Mas Lula tem uma outra virtude muito rara que pode compensar essa falta de visão estratégica no contexto nacional e internacional que é uma disposição muito firme de ouvir, negociar e aprender, o que somado com uma atração carismática natural pode fazer com que alguns luminares do pensamento nacional possam com ele colaborar e suprir essa carência.

2 - O socialismo e a ruptura. Sim, Lula é socialista assim como a maioria da cúpula petista. Passou por treinamento ideológico pesado e sua forma de pensar é marxista, não há como negar isso. Mas mesmo que quisesse o PT não teria como fazer a ruptura e muito menos implantar o socialismo. O mundo mudou e o fim do Império Soviético, a guinada da China para o capitalismo e até a simbólica abertura de enclaves capitalistas na Coréia do Norte, o último reduto marxista do planeta, que vaga na miséria absoluta, constituem-se em exemplos cabais de que a opção socialista passou, faz parte de um passado que não volta mais. Risco zero.

3 – Corporativismo e reformas. Pode parecer brincadeira, mas o programa do PT é mais positivo que o de Serra, Ciro e Garotinho no que tange às reformas da previdência e fiscal. Se vão de fato fazer o que escreveram é outra história e cabe à sociedade cobrar.

4 – Os economistas do PT e a crise. Este é um risco real, pois Guido Mantega cotado para ministro da fazenda diz que um pouco de inflação não faz mal, o que é pouquíssimo recomendável num país que passou décadas convivendo com inflação pornográfica. A inflação é o maior mecanismo de concentração de renda que se conhece e o PT não é claro em sua opção pela defesa intransigente da moeda. Paul Singer, outro luminar entre os economistas petistas, crê num Estado forte e interventor, modelo que só deu desgostos no Brasil e em qualquer outro país onde foi implantado. Maria da Conceição Tavares ainda acredita em controle de preços e é a favor de ruptura com os mercados, sendo que Luciano Coutinho e Belluzzo seguem acreditando demais em Lord Keynes e de menos em austeridade orçamentária. Sim, tudo isso é verdade e preocupa muito, mas o PT dispõe também de João Sayad, ex-ministro e atual secretário de finanças do PT no município de São Paulo que calejado pelos fracassos intervencionistas dos sucessivos planos de estabilização da infeliz era Sarney e tendo de administrar austeramente e sob a nova lei de responsabilidade fiscal as finanças da maior cidade do país, aprendeu as virtudes do equilíbrio fiscal e hoje é seu ardoroso defensor. Tem também Aloysio Mercadante que menos experiente na execução é formulador inteligente e crê do equilíbrio fiscal e orçamentário como pré requisito ao desenvolvimento. Lula também não vai abrir mão de chamar gente de fora do partido e já deixou isso claro em várias oportunidades, pois sabe que sua chance é única: Acertar ou acertar, vencer ou vencer. Lula viveu o suficiente para saber que em economia mais do que em qualquer outra área os milagres definitivamente não existem.

5 – Os radicais. Sim estão todos lá, mas o fato é que o que lhes restará será algum cargo de segundo ou terceiro escalão, pois não predominam no partido já de algum tempo. Vão atrapalhar aqui e ali, vão fazer marola lá e acolá, mas não participam no núcleo do poder e não participarão do núcleo do governo. Não vão atrapalhar mais do que o baixo clero da base de apoio de FHC atrapalhou ao próprio.

6 – Corrupção. Olívio Dutra se envolveu com bicheiros e o caso da prefeitura de Santo André dá a impressão de ainda estar muito mal contado, sem falar dos contratos de prefeituras petistas com cheiro de corrupção. Tudo verdade. Mas também é verdade que o partido julgou moralmente o atual governador gaúcho e ele nem é candidato à reeleição, perdendo a indicação para Tarso Genro. Também é verdade que as investigações sobre Santo André estão correndo dentro da lei e, até agora, nada foi encontrado que comprometa o partido e, também, que o índice de corrupção nas prefeituras petistas é considerado pelos próprios fornecedores das mesmas como bastante moderado quando comparado com a média nacional.

7 – Vexame. Lula não é um homem de boas maneiras ou fino trato e o Brasil inteiro sabe disso. Sua origem é outra e choca um pouco os ambientes da alta diplomacia e das altas esferas do poder nacional e internacional. No entanto é pouco provável que vá ser desrespeitado por conta disso, pois qualquer líder mundial que o encontrar saberá muito bem que estará falando com outro líder eleito democraticamente para dirigir a nona economia mundial do alto de cinqüenta milhões de votos ou mais, e isso é suficiente para impor respeito em qualquer salão do planeta por mais requintado que seja. Alguma gafe será inevitável, mas fará parte do folclore político como as “ranelas” de Sarney ou o “duela a quien duela” de Collor tentando impressionar os argentinos com um linguajar espanhol inexistente.

8 – O Estado forte. Outro risco real. O PT define o socialismo hoje como sendo a opção de usar o poder do Estado para transferir renda da parte ganhadora da sociedade para os menos favorecidos. Quanto mais forte for o Estado, mais renda poderá transferir para os mais necessitados e mais rapidamente a dívida social poderá ser quitada. A realidade, no entanto, mostra o contrário, pois é exatamente nos países onde o Estado foi abandonando sua tentação à intervenção que os pobres mais evoluíram e a renda mais se distribuiu. Pode-se falar tudo da era FHC, mas a transferência de renda para os mais humildes foi brutal durante o período, devido às políticas compensatórias que cresceram muito e que o PT também pratica em suas administrações, mas devido, principalmente à defesa da moeda que o PT não considera prioritária. FHC diminuiu o poder do Estado, investiu em políticas compensatórias e defendeu a moeda. O PT pretende manter ou ampliar as políticas compensatórias, aumentar a intervenção do Estado e deixar rolar um pouco de inflação se prevalecer a tese dos estatistas do partido. Se essa política for realmente implementada haverá transferência de renda da base da pirâmide para a classe média e para os setores industriais com o aumento de consumo de bens duráveis de maior valor agregado. Realmente tem-se aqui um risco, mas pelo programa apresentado pelos demais candidatos neste particular não parece haver clareza maior e nem risco menor que o oferecido pelo PT.

9 – MST, CUT etc. no poder. Pode ser que sim pode ser que não, mas aqui Lula tem razão – Quem melhor que ele para controlar essa turma toda?

10 – EEUU. Se simplesmente virarem as costas meno male, pois houve épocas em que batiam de frente e desestabilizavam governos inoportunos. Salvador Allende foi o único socialista eleito na América do Sul e o resultado foi catastrófico em todos os sentidos, mas já lá se vão quase trinta anos e o mundo é outro como já vimos. Por outro lado o Chile não é o Brasil e este não é o Chile. No Brasil as coisas nunca chegam às últimas conseqüências haja vista o baixo número de mortos e desaparecidos durante a longa ditadura militar no país quando comparados aos mesmos números no Chile e na Argentina. A conciliação e a busca permanente de consenso é uma das mais fortes características do povo brasileiro e nem Lula nem seus eventuais opositores vão transgredir esse paradigma. Quanto à postura da maior potência do planeta em relação ao Brasil deve-se analisá-la no contexto histórico ao longo dos tempos. Os dois maiores parceiros das Américas estiveram do mesmo lado na Primeira Grande Guerra e assim o fizeram também na Segunda, quando o regime político brasileiro era muito mais similar aos do eixo ítalo-germânico e com este tinha grande afinidade. Estiveram ainda do mesmo lado na Guerra Fria e a superpotência do norte emprestou seu apoio aos militares quando assumiram o poder e ao grupo consensual da Nova República quando aqueles deixaram o poder. Apoiaram o Brasil na crise da dívida de 1982 e, de novo, em 1992 apesar da moratória unilateral brasileira de 1986. Apoiaram FHC na crise de 1999 e de novo agora na deste ano. Na verdade nós brasileiros deveríamos ser mais gratos aos amigos do norte embora nem sempre o sejamos. A longa história de amizade e de estreita cooperação indica que não há nenhuma razão para acreditar que os Estados Unidos vão abandonar o Brasil se Lula for eleito. Acho mesmo que vão negociar e vão continuar ajudando como sempre fizeram. Não lhes interessa o caos e nem a nós.

O segundo fato a ser analisado é como a sociedade em geral e o mercado em particular vão reagir a Lula. Já vimos que o candidato em si e o partido não são o bicho de sete cabeças que alguns ainda acreditam que são, mas é preciso que não só não sejam de fato, mas que também pareçam não ser, pois a opinião pública e os mercados se movem pelas expectativas mais do que pelos fatos objetivos e quando essas expectativas saem de controle os mecanismos de controle social e financeiro não operam, não funcionam, entram em pane. Esse é, a nosso ver, o maior risco que Lula o PT e o Brasil correm. Vimos nestes dias o que um boato generalizado pode fazer numa cidade como o Rio de Janeiro quando a maior parte do comércio cerrou as portas e a polícia foi toda para a rua para garantir o direito dos comerciantes que, a rigor, nem estavam verdadeiramente ameaçados. O que restou é que prejuízos enormes ocorreram e não há como compensá-los. Guardadas as proporções é o que pode ocorrer com o país no caso de uma vitória de Lula e de uma má gestão de relações públicas dele e do PT nos momentos que se seguirem à divulgação do resultado da eleição. Tranqüilizar a opinião pública e o mercado será o desafio primeiro e imediato a ser enfrentado.

Nessa difícil tarefa ajudaria muito a antecipação de nomes respeitados pela opinião pública, pelos partidos políticos e pelo mercado para conduzir a transição do governo e, se possível, e, igualmente altamente recomendável, os nomes do ministro da fazenda e do presidente do Banco Central. Também ajudaria muito a antecipação de medidas tranquilizadoras no que se refere à política fiscal e monetária.

Como vimos o desafio não será pequeno para Lula e o PT caso ganhem a eleição, mas será também uma grande oportunidade para passarem para a história como os homens que mudaram o país para melhor, com um governo pela primeira vez verdadeiramente oriundo das bases da população brasileira. Oportunidade histórica e importante demais para não ser bem aproveitada. Resta torcer muito e ajudar no que for possível.


 
 
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