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Segunda-feira, 17 de dezembro de 2001.
Uma das melhores conseqüências, se não a melhor de todas, do processo de redemocratização brasileiro foi a abertura dos canais de participação para a numerosa classe média do país. Composta por pequenos empresários, profissionais liberais, operários qualificados, funcionários públicos e privados e estudantes de nível médio e superior, essa classe média acabou se transformando no grande eleitor do país. Foi ela que elegeu Collor e depois Fernando Henrique, e é ela que vai eleger o próximo presidente.
A vantagem de ter uma classe média tão numerosa e tão heterogênea faz do Brasil um país sólido e viável, porque todas as democracias verdadeiras do mundo funcionam exatamente assim; a classe média decide ! Assim, todos os candidatos, marqueteiros, estrategistas políticos e financiadores de campanha procuram entender o pensamento desse grande eleitor, influenciar seu modo de pensar e oferecer-lhe a opção de voto mais adequada. É por isso também, que as campanhas de todos os candidatos cada vez ficam mais parecidas.
Se analisarmos as vitórias de Collor e FHC nas três eleições passadas fica fácil entender o que procura esse grande eleitor: estabilidade da moeda, segurança pública, desenvolvimento econômico, fim dos privilégios e contenção dos gastos. Em suma; nosso grande eleitor é conservador. Foi por isso que Lula e o PT perderam as eleições citadas. O PT só agora começa a entender que se quiser ser mais do que eterno segundo colocado precisa mudar o discurso, precisa mostrar ser capaz de governar com responsabilidade e assegurar o que já foi conquistado em termos de estabilidade e avançar em direção ao desenvolvimento. Pior, o PT precisa mostrar tudo isso na campanha, mas precisa que o grande eleitor se convença disso. Como diziam da mulher de César não basta ser é preciso parecer que é também.
O grande eleitor não tem deixado de observar atentamente a situação argentina e as tenebrosas conseqüências sociais que o país vizinho enfrenta por não ter conseguido equilibrar seus gastos. O Brasil continua dependendo da boa vontade externa (FMI) para fechar suas contas. O grande eleitor gostaria de ter um presidente que pareça sério e capaz de negociar corretamente com o Fundo, e cumprir o que combina com o mesmo. Ciro Gomes e Lula ainda pregam ruptura, nesse aspecto, ao invés de entendimento. Itamar Franco e Garotinho não passam imagem de seriedade e competência nessa área. Tudo isso tem sido captado em pesquisas qualitativas que circulam febrilmente entre as equipes dos pré-candidatos. É por isso que as chances do chamado candidato governista continuam, pelo menos teoricamente, altas. É por isso, também, que o apoio de FHC, que já foi considerado mico até algum tempo atrás, voltou a ser muito importante para qualquer candidato da coligação governista. A questão chave então é: Quem será o candidato do governo ? Roseana, Serra ou Tasso ?
O fator Roseana cria interessantes desdobramentos para o stablishment político brasileiro. O maior de todos é que ela roubou os votos de Ciro e de Itamar, praticamente inviabilizando a candidatura dos dois. Mas existem outros, menores, mas tão importantes quanto:
1 - Roseana é PFL, mas o PFL verdadeiro, aquele que, dizem, é governo desde de Pero Vaz de Caminha, não a quer presidente, pois a filha de Sarney faz outro tipo de política, completamente diferente do pai e também de FHC. Pode ser conflito de gerações, mas o fato é que o poder dos caciques do PFL e principalmente os “negócios” que se acostumaram a fazer no poder, não teriam espaço com a filha de Sarney. Sua candidatura só surgiu porque os pefelistas não confiam que Serra será tão pragmático como FHC no que diz respeito a pagar o preço pela sustentação política. Mas ninguém acredita, dentro do partido, que esse “pragmatismo” seria maior com Roseana.
2 – Serra, o único candidato viável do PSDB, vê suas chances de crescimento nas pesquisas serem barradas pela fulgurante ascensão da maranhense. FHC terá que convencer seu preferido a compor com o PFL, quando o que o ministro da saúde queria mesmo era compor com o PMDB e diminuir a influência pefelista na coligação, o maior problema do governo FHC, ao seu ver.
Assim, a lógica política atual joga a favor de uma composição entre Serra e o PFL que pode levar Roseana a vice, ou mesmo ao Senado, que é o que ela queria desde o início. Não é o que Serra desejaria, não é o que o PMDB deseja, mas é a lógica que os fatos estão impondo. A não ser que o grande eleitor continue despejando crescentemente suas intenções de voto na governadora do mais pobre Estado brasileiro, cujos percentuais já encostam nos de Lula. Sim, porque nesse caso, poderemos assistir um novo fenômeno Collor, quando um candidato de fora do núcleo de poder de seu próprio partido se impõe avassaladoramente e, aí sim, vamos ter desafios muito importantes pela frente, que logo poderão estar sendo captados pelos mercados.
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