|
Sexta-feira, 23 de agosto de 2002.
Se há uma coisa que tira Ciro Gomes da linha é compará-lo com Collor. E as comparações não só não diminuem como estão aumentando conforme o candidato se expõe mais ao conhecimento público depois que subiu fortemente nas pesquisas de opinião.
Tais comparações não são ideológicas nem programáticas, pois devemos lembrar que as idéias de Collor não eram tão ruins assim, tanto que acabaram sendo postas em prática por FHC com resultados melhores do que o momento atual de pessimismo nos permite supor. Privatizações, abertura dos mercados, maior inserção internacional, fim da inflação, enfim tudo que o consenso exigia na época e que Collor incorporou a seu discurso e prática e que só não levou mais adiante por ter-lhe faltado tempo. A rigor qualquer fosse o presidente na era FHC as medidas seriam as mesmas, mesmo que fosse Ciro, que no curto espaço como ministro do final do governo Itamar só tomou uma medida importante, exatamente aquela que escancarou unilateralmente o mercado brasileiro para as importações, bem de acordo com o ideário Collorido.
Se hoje os tempos são outros e a tese da prevalência absoluta dos mercados é questionada em toda a América Latina, não se pode esquecer que Ciro fez parte desse ideário e, se mudou, como parece que mudou, isso faz parte da vida e é até elogiável posto que o ser humano é animal evolutivo. As comparações incomodam porque longe de insinuar semelhanças ideológicas insinuam semelhanças temperamentais.
Ciro como Collor, é desprovido daquele bom humor auto-indugente que faz com que os líderes verdadeiramente carismáticos não se levem tão à sério assim, fruto daquela consciência própria de que são falhos como qualquer outro mortal. Faltam-lhes a ambos aquela grandeza, que só a sabedoria traz, de tomar a política e a vida como a arte do possível. São inteligentes porém não sábios.
Passam a sensação de que sentem-se incompreendidos pelo resto das pessoas, mas eles é que não compreendem as pessoas e, assim, o mundo à sua volta.
Ciro está cercado por apoios controversos e contraditórios de raposas que se tiverem um mínimo de influência em seu governo impedirão que faça as reformas que diz que vai fazer. Mas Ciro não se preocupa, diz que não tem compromisso com nenhum deles, mas ao mesmo tempo diz que vai precisar deles no Congresso para aprovar as reformas ?!?! Vão aprovar tudo sem exigir nada em troca ? Collor também chegou ao poder sem grande compromissos e essa foi a maior causa de sua debacle e do preço altíssimo que todos os brasileiros pagaram por ela. Teve enormes dificuldades de compor o governo com nomes viáveis e sempre esteve absolutamente só apesar de, sintomaticamente sempre clamar aquele slogan: _Não me deixem só !
Ciro, se chegar ao poder, não estará tão só assim. A sociedade brasileira amadureceu muito nos últimos doze anos e, certamente, haverá consenso para fornecer-lhe uma base mínima de governabilidade. Lhe faltará porém o mais importante, a cumplicidade amiga daqueles que se unem ao chefe não só por obrigação, patriotismo ou interesse próprio, mas também por admiração sincera. Até entre seus aliados atuais há um sentimento de estranhamento com o que julgam ser uma certa esquisitice do candidato, gente que já acha que vai para a oposição no dia seguinte à posse se houver vitória. Assim não dá para ser muito otimista mesmo e as comparações tornam-se inevitáveis.
O comportamento do candidato, ora irritadiço, ora agressivo, acaba por amedrontar as elites que começam a desconfiar do pior e os mercados que vivem de antecipar sentimentos já esboçam uma revoada que nem o acordo com o FMI conseguiu afastar. Talvez fosse melhor para o Brasil que Ciro perdesse a eleição, talvez fosse melhor para o próprio Ciro que parece ser um homem de bem.
|
|