Quinta-feira, 2 de outubro de 2003.
Ao contrário do que muitos pensam, a atual calmaria dos mercados com o dólar relativamente baixo, risco país de volta aos níveis de 2001 (ainda altos) e bolsas em alta, não garante que estejamos entrando em uma fase de espetáculo de crescimento. Pelo contrário, pode ser aquela famosa calmaria que antecede as tempestades. O governo petista pode estar hoje no auge de sua popularidade e de seu prestígio no país e no exterior, mas há uma grande probabilidade que, doravante seja ladeira abaixo.
A calma com que algumas autoridades do governo afirmaram que um novo acordo com o FMI é desnecessário é só aparente: Nenhum dos “top decision makers” da área econômica pensa, ou pensou por um segundo sequer, em abrir mão da única âncora efetiva da economia nacional que é o monitoramento pelo FMI. Todos os economistas sérios, no governo ou fora dele, sabem muito bem que a situação do endividamento público no Brasil é alarmante e que sem o monitoramento permanente do Fundo, a economia desmorona como um castelo de cartas. O Fundo fica e continua recomendando regras de condutas que serão estritamente cumpridas e fica, não por apenas mais um ano, mas, provavelmente, por muitos mais, no mínimo por toda a atual gestão, pois essa é a única atitude séria e responsável a tomar. Sem o Fundo o governo não consegue resistir às pressões por gastos e o filme se repete infinitamente, com gastança, quebra e ... o retorno do fundo para arrumar a casa de novo. Parece que pelo menos isso o Brasil aprendeu e, desta vez, até o PT aceita que, ruim com o Fundo, pior sem ele.
Isso posto, fica claro que o espetáculo do crescimento vai ficando cada vez mais distante o que terá, claro, conseqüências políticas. Algumas já perceptíveis:
1 – Os governos estaduais e municipais premidos por queda de arrecadação (seu principal tributo o ICMS cai junto com a atividade econômica) vão buscar em novas taxas (do lixo, de iluminação, de esgotos, radares etc. etc.) a receita que perderam, com grande desgaste eleitoral.
2 – Os chamados setores produtivos estão, crescentemente, descontentes e, pior, desesperançados com a situação geral. No passado tal sentimento levou à conseqüências funestas.
3 – A aliança governista, PT em particular, tenta substituir a falta de fatos positivos concretos com muita propaganda para aliviar o espectro.
4 – Os partidos escancaram suas sujas entranhas entregando-se ao troca- troca de siglas em busca de abrigo junto aos cofres oficiais.
5 - Na arena internacional, o principal parceiro, irritado com as posições do Brasil na última reunião da OMC, parte para uma política de rolo compressor nas negociações da ALCA, que, na melhor das hipóteses, vai deixar muitas feridas em aberto.
O cenário para o futuro próximo, como se vê, não permite muito otimismo. O presidente terá, mais do que nunca, que usar todo seu inegável carisma e infinita capacidade negociadora para driblar toda sorte de dificuldades. Reformas incompletas e insuficientes, crescimento exagerado dos gastos públicos (principalmente pelo pagamentos de juros escorchantes) e estímulo ao ganho financeiro improdutivo levam a economia nacional a uma espécie de beco sem saída, sufocada, deprimida e combalida. E o pior é que ninguém consegue recomendar uma saída lógica, racional e vencedora. O país foi levado a uma situação sem precedentes, onde esgotam-se as possibilidades de sucesso.
Nunca é demais citar as soluções, mas nem o mais otimista dos ingênuos acredita que ainda possam ser aplicáveis:
1 - Redução do gasto público com ênfase na reforma da previdência.
2 – Redução dos juros para desonerar o fluxo de caixa da União.
3 – Reforma tributária e trabalhista para desonerar a produção.
4 – Reforma política.
5 - Introdução de medidas disciplinadoras dos fluxos de capital.
Todas essas medidas estão na agenda do país há pelo menos 15 anos mas não avançam tamanho são os interesses contrários que se organizam para evitá-las. O PT tem como atenuante o fato de que está sendo apenas mais um dos muitos grupos que, uma vez no poder, tentaram e fracassaram.
Quando o cenário se fecha num aparente paradoxo insolúvel a realidade acaba se impondo e leva a soluções inesperadas, freqüentemente inusitadas. Pode ser que estejamos caminhando para algo nessa linha.
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